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minhas notas

04.09.14

De vez em quando, no contacto e na conversa com muitos cristãos da nossa Diocese e até de outras Dioceses, quando vem para o centro da cavaqueira a participação na Eucaristia dominical e o empenho dos cristãos locais nas ações e nas atividades da paróquia, alguém diz sempre: «Sabe, o nosso padre não cativa, não chama», ou então «o nosso padre está velho e cansado». São piedosas desculpas que nós padres estamos fartos de ouvir, que não justificam nada. As pessoas habituaram-se a dizê-las irrefletidamente, não se apercebendo que, ao proferi-las, estão a falar mais delas do que dos seus párocos. Temos uma multidão de cristãos que, apesar de ter feito todo o percurso catequético e de cumprir toda uma tradição que lhe é dada a beber pela família ou pelo meio ambiente, por dentro não se converteu a Cristo e ao Evangelho, nem se sente parte ativa e integrante da Igreja. O coração permanece pagão. E quando não há «conversão» e verdadeira adesão a Cristo e à Igreja, depois passa-se o tempo todo a inventar desculpas para não se viver o que não se quer viver e o que de verdade não se quer assumir. Tem de haver sempre um «alguém» que é o culpado por aquilo que eu dissimulo que desejaria fazer e viver, mas não faço nem vivo, que esconda a minha incoerência, o meu comodismo, o meu egoísmo, o meu desinteresse e a minha apatia. 

Não ignoro que os padres não são todos iguais e que nem todos têm o mesmo brio pastoral. Os temperamentos, os caracteres, as formas de estar, as qualidades, o zelo e o empenho pastoral variam de padre para padre. Ainda assim, cada um é como é, possivelmente empenhado em aprofundar as suas virtudes e em corrigir os seus defeitos, e tem o direito de ser como gosta de ser e ninguém tem de ser igual a ninguém. O ser padre e o poder ser padre obedece a um conjunto de traços espirituais, humanos e sociais, que a Igreja identifica como vocação, mas esta é vivida na unicidade, na especificidade e na fragilidade de cada pessoa. Os padres, ou quem quer que seja, não são formatados e não são feitos em série. Aceito, até certo ponto, que a intervenção e a ação de um padre também é determinante na vida e na construção de uma comunidade cristã. Mas não é decisiva, nem o pode ser. Um cristão ou uma comunidade que assim o pense ainda não cresceu e vive na menoridade cristã e se um padre age atraindo para si todo o protagonismo, abusa do seu ministério e não ajuda a sua comunidade a crescer e a caminhar. Quanto à afirmação de que o «padre está velho e cansado», o que é que se pode dizer? Então os padres não envelhecem e não se cansam como as outras pessoas? O tempo faz-nos perder energia, mas dá-nos sabedoria e maturidade. A Igreja não pode viver só de padres novos. O equilíbrio e a troca de experiência entre gerações é fundamental. Muito bom cristão peca muito quanto ao respeito para com os padres mais velhos, que são uma riqueza na Igreja. Os padres que mais me têm influenciado e marcado são padres mais velhos.  

Um cristão esclarecido, bem formado e maduro, sabe que a vivência da sua fé e o seu compromisso com Jesus Cristo e com a Igreja não está dependente da desenvoltura e da habilidade do seu pároco ou da sua capacidade de estratégia e da sua performance e sedução comunicacional e celebrativa, já que sabe sempre que diante de si terá sempre um homem com qualidades e limitações. Vai-se à missa e participa-se ativamente na vida da Igreja porque se tem fé e se quer celebrar e fortalecer essa fé e viver em partilha e comunhão com todos os crentes em Jesus Cristo. Se alguém aceitou ser cristão foi porque Jesus Cristo, com quem se vive em relação, o Evangelho e a vida da Igreja o seduziram e cativaram. É em Jesus Cristo que temos de nos centrar e não no padre, que pobremente o representa. Cristo é que cativa. O ser cristão e viver como cristão não é uma questão de padres, mas é um compromisso e uma opção decidida e assumida livremente por Jesus Cristo e pela Igreja. O problema de fundo, que leva muitos cristãos a dizerem «o padre não cativa», é a falta de convicção e de maturidade cristã. A fé não chegou ao coração. Temos muitos cristãos que não têm convicções, não disfarçando que vão à Igreja por conveniência ou arrastamento. Infantilmente, confundem a fé e a religião com o padre, estando sempre à espera que venha o padre das novidades ou o padre porreiro para entreter e conviver, mas que não proponha a exigência, a conversão e a coerência. É o padre que não cativa ou sou eu que, afinal, ainda não estou nem nunca estive cativado por Cristo e pela Igreja?

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