31.01.19
Por estes dias, encontrei uma senhora idosa no adro da Igreja, com o olhar fito nas árvores, quase nuas das bonitas e verdejantes folhas, que vistosamente exibiram durante o verão. Cumprimentei-a. Muito calmamente, virou-se para mim e sentenciou: «Senhor padre, o que eu fui e o que eu sou. Fui uma mulher vivaça, trabalhadora, lutadora, cheia de genica, agora estou como estas árvores, nua de cabeça, de forças, de tudo. Estas árvores somos nós. Tudo tem o seu fim.» Neste mês de novembro, em que somos convidados a rezar pelos defuntos, somos confrontados com a realidade da morte e a caducidade da vida, realidades que o mundo de hoje procura esconder ou disfarçar. Mas tudo se acaba mesmo? Tudo passa, é verdade, mas o amor e o bem nunca passarão. Ficam para sempre.
Uma história judaica (abreviada) conta o seguinte: um homem tinha três amigos. Um dia foi surpreendido por uma intimação do Rei que o instava a comparecer no Palácio Real. Inexperiente nestes encontros, foi ter com o primeiro amigo, considerado inseparável, para que o acompanhasse, mas disse-lhe que não o podia acompanhar. Partiu à procura do segundo amigo, com quem se encontrava de vez em quando para conversar e beber uns copos. Dispôs-se a acompanhá-lo, mas só até à porta. Não dava. Restava-lhe o terceiro amigo, aquele que via por mero acaso apenas uma ou duas vezes no ano. Para seu espanto, dispôs-se a acompanhá-lo até junto do Rei. Moral da história: o amigo n.º 1 é a nossa própria vida, a minha própria vida; eu e a minha vida, os meus trabalhos, os meus negócios, os meus projetos. Andamos sempre juntos, mas, quando eu morrer, de facto, nada disso me vai acompanhar; o amigo n.º 2 são os nossos próprios amigos: podem acompanhar-nos só até à porta do cemitério; o amigo n.º 3, aquele que raramente vemos, é o bem que fazemos ao longo da nossa vida; é o amor que pomos naquilo que humildemente fazemos. É o único amigo que nos acompanhará sempre, para todo lado. É com este amigo que nos devemos preocupar mais.
Vivemos num tempo em que as pessoas agem mais por interesses do que por valores e princípios. Daí a crise moral em que vivemos, fonte de todas as crises. Há que mudar de rumo: só uma vida centrada no bem e no amor será uma vida verdadeiramente realizada, que Deus não deixará no esquecimento.