03.01.23
Muitas das recentes tragédias e calamidades que têm acontecido junto dos aglomerados põem em evidência a falência do espírito e da dinâmica de comunidade. Já lá vai o tempo em que as pessoas se juntavam para realizar atividades e eventos em conjunto, se organizavam em torno de iniciativas e projetos para benefício do bem comum e da qualidade de vida de todos. Por todo o lado se ouve o queixume de que já não há o mesmo empenho e interesse por aquilo que, noutros tempos, se fazia com brio em comunidade, como por exemplo limpar as poças coletivas, os regos da aldeia, os caminhos públicos, a recolha de lenha no monte, a limpeza das ruas, intervenções e socorro de necessidades, a realização da festa ou das festas da terra sem lamúrias, realização de convívios para aprofundamento da comunhão e da fraternidade, entre outras coisas. Agora é notório, infelizmente, que as pessoas andam mais desinteressadas e desgarradas umas das outras, o individualismo, o comodismo pessoal e o interesse particular prevalecem sobre o bem da comunidade.
No entanto, começamos a perceber que é importante recuperar o espírito de comunidade mais do que nunca, porque somos cada vez menos e estamos mais frágeis. O revigorar a dinâmica de comunidade será a salvação daqueles que restam nas aldeias e vilas do interior. Hoje vemos muitas pessoas a morar juntas, mas não fazem uma comunidade, mal se conhecem, não se preocupam umas com as outras, não querem saber umas das outras, nunca participam em nada, não se empenham em nada pelo bem da comunidade, vivem única e exclusivamente para os seus interesses pessoais e para o seu grupo restrito de amigos, os outros não existem. Muitas pessoas que vivem na mesma terra nunca estão onde está a comunidade, nunca organizam nada e nunca participam em nada que é organizado para enriquecimento da comunidade.
Em muitas aldeias e vilas, e até cidades, diluiu-se o espírito e a vida comunitária. Muitas comunidades estão mortas e mortiças, desorganizadas, desencontradas, sem vitalidade e sem iniciativa, amorfas e apáticas, acomodadas ao Estado e à iniciativa dos seus representantes ou de um ou outro mais atento e afoito. Contudo, nada substitui a comunidade e se queremos melhorar a nossa vida no interior, ou pelo menos sobreviver, com os muitos problemas e desafios que temos pela frente, com os poucos meios que temos ao dispor e com os que aqui resistem em viver, é na recuperação da vida da comunidade que o podemos fazer.