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minhas notas

06.06.13

Dois equipamentos ou instrumentos marcam a vida contemporânea: a televisão e o computador. Este revolucionou a nossa capacidade de organização e de trabalho, proporcionou-nos uma comunicação muito mais célere e eficaz, aproximação e construção de redes transversais e globais, para lá do muito lazer que também oferece, sempre à mão com meia dúzia de cliques. A televisão tornou-se a grande animadora dos ambientes sociais e dos serões familiares. Ou até mais do que animadora: a televisão é hoje, em muitas casas, o pão intelectual e a grande formadora das consciências, formatando os hábitos, valores e comportamentos de uma grande massa social.

Passamos muito tempo diante da televisão. Rendemo-nos excessivamente à televisão. Tornámo-nos consumidores de televisão, sem critério e consciência crítica. Isto tem algum mal? Claro que tem. As pessoas deixaram de dar tempo a atividades e ações muito mais enriquecedoras para a sua vida, como ler bons livros, dar tempo a associações e a instituições, dar tempo aos outros, cultivar a amizade, o encontro e a partilha, a exploração da criatividade e de dons e talentos profícuos para a vida social e comunitária, entre outros. E tem, sobretudo, devido ao produto que a televisão oferece, que, na sua maioria, é de média e má qualidade. Compreendo que a televisão também é para entreter, mas, na sua base, não temos uma televisão responsável e exigente, com critérios educacionais, culturais e formativos bem vincados, inspirados na excelência da humanização e da socialização, mas temos uma televisão regida pela mínima preocupação ética e cultural, obcecada por audiências a qualquer preço, geradoras de dinheiro. A televisão oferece muito lixo às pessoas e muitas pessoas não têm suficiente espírito crítico para saberem questionar e recusar a lixeira que lhes oferecem, deixando-se estar anestesiadas e atónitas diante da televisão, adormecidas num entretenimento que pouco ou nada lhes acrescenta à vida. Daqui advém, claro, uma sociedade pouco culta, sem ginástica intelectual, inerte, indiferente, viciada na facilidade e no comodismo. Vivemos numa sociedade dependente da televisão. Tornou-se mesmo um sedativo para ajudar a passar o tempo e a adormecer, sem acrescentar mais cultura e educação à vida das pessoas.

Reparemos até nas causas e nos efeitos do zapping (passar de uns canais para os outros para ir passando o tempo), que, em algumas pessoas, é uma dependência. Tudo nos interessa e nada nos interessa. Sem qualquer objetivo e referência, absorvemos uma cascata de sons, sensações e imagens, numa voracidade tonta por tudo e por nada, captando tudo pela rama, na falsa perceção de que estamos atualizados com o mundo, quando não estamos. No fim, não fica senão uma grande inquietação interior e um grande descontentamento, porque nada ou quase nada interessou, nada ficou para a vida, não se deu dinamite à inteligência e sobressaltos ao coração, tudo foi um passar de tempo entediante, que de forma insuspeita, vai tornando as pessoas sem gosto por nada, amorfas e apáticas, abúlicas e crestadas. Parece um diabético a contemplar um sortido de doces.

Já aqui o disse mais do que uma vez a impressão, que já é uma convicção, que tenho dos tempos atuais: tem-se muita informação para não se saber nada ou quase nada. A informação entrou na órbita do consumismo. Devoram-se notícias e mais notícias, anda-se avidamente atrás de novidades e mais novidades, mas não se questiona e analisa e não se faz uma triagem e uma síntese, porque faltam alicerces e referências, de forma que pouco saber e pouca sabedoria se adiciona à vida. Vivemos numa cultura vaporosa e líquida, que gosta que tudo seja intenso, mas rápido, que nada se firme e que tudo corra, em nome de uma avidez vaga, que não sabe o que quer e para onde quer ir. Até os debates televisivos já nem formam nem informam, porque o que interessa é ganhar a luta e dominar o espetáculo do debate e não esclarecer e apontar caminhos e soluções da parte de quem abarca o saber.

Repensemos o tempo que damos à televisão. Muito desse tempo é tempo perdido. O quadradinho mágico há muito que deixou de o ser. Uma televisão assim faz-nos pouca falta. 

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