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minhas notas

03.06.11

1.Deixo-vos aqui, antes de mais, um pequeno conto de Sérgio Bocchini, com uma pitadinha de provocação, que diz assim: «Quando o leão morreu, os animais da floresta reuniram-se para eleger um novo chefe. Nos últimos tempos, havia muita anarquia na selva: o velho rei, adoentado e sem forças, já não conseguia fazer respeitar a lei e quase todos os animais se tinham aproveitado para fazer o que lhes apetecia.

Foi então que o rinoceronte, erguendo altivo a sua grande cabeça, disse:

- Chegou a hora de restabelecer a ordem na selva. Não se pode consentir que cada qual faça o que quer. Decidiram então marcar eleições para eleger o novo rei da selva. O convite foi enviado a todos os animais com direito de voto. O urso leu-o e, bocejando, disse:

- Pensarei nisso no fim do letargo. Voltou-se para o outro lado e continuou a ressonar.

O javali pensou que não valia a pena gastar tempo com essas coisas. Enquanto procurava no chão algo para comer, resmungou:

- São todos uns ladrões e aproveitam-se do poder para enriquecer.

O pai e a mãe lobo andavam muito atarefados a cuidar da sua ninhada e não ligaram a isso de eleições. O castor, muito ocupado na construção da sua casa, não estava para perder tempo para ir votar. O elefante que, como se sabe, tem uma memória formidável, lembrou-se das fraudes cometidas nas últimas eleições e decidiu não se deixar de novo enganar. A altiva e aristocrática girafa, que aproveitava toda a ocasião para expressar o seu desprezo pela democracia, olhou de alto para baixo e disse:

- Não quero misturar-me com o povo sujo e ignorante!

Por causa de tudo isto, no dia das eleições, apresentaram-se junto da urna apenas duas macacas, um rinoceronte, um velho camelo e uma raposa tagarela, que convenceu os poucos eleitores a votar na sua amiga hiena, prometendo vantagens e benefícios pessoais. Deste modo, a hiena foi democraticamente eleita, por maioria absoluta, rainha da selva. Já era demasiado tarde quando os outros animais se deram conta de que tinham escolhido como chefe um animal repugnante e sem escrúpulos, orgulhoso e estúpido, pior que o velho rei leão».   

 

 O que a bicharada não sabe de democracia! Ao lermos o pequeno conto, não podemos deixar de nos identificar com algum dos intervenientes. E, no seu todo, é um belo retrato do que se tem vindo a passar com a nossa maior conquista dos últimos tempos: a democracia. De eleição para eleição, tem vindo a crescer o alheamento e a indiferença dos cidadãos. Como acabámos de ver, as consequências podem ser devastadoras: a mediocridade e a incompetência podem tomar conta dos centros de decisão. Compreendo que as pessoas andem desiludidas com a discussão política e frustradas com o fartote de promessas que políticos excitados e delirantes propõem e não cumprem. Veja-se, mais uma vez, a triste e lamentável campanha política a que estamos a assistir: gritaria, insultos, intolerância, malcriadez, ilusionismo, Chico-espertismo, acusações hipócritas, demagogia, mentira, agressividade e sectarismo. Os apelos do Senhor Presidente da República ficam para os anjinhos do céu. Que tristeza, meu Deus! Em vez de se fazer primar na campanha uma séria e esclarecedora discussão de ideias e de projectos, apontando-se caminhos, soluções e saídas para o difícil estado do país, com a devida medida de racionalidade e elevação, prefere-se o desgastante pugilismo pacóvio entre as trincheiras partidárias, a que nos têm habituado nos últimos anos. Mas, ainda assim, não é razão para não se ir votar. Muito pelo contrário. Se a realidade politica não é do nosso agrado, podemos mudá-la com o voto e não ficando em casa, deixando que tudo fique na mesma e não se operem mudanças. Ou confirmar, se se acha que tudo assim está bem. E quem é cristão, porque é cristão, tem um dever acrescido de o fazer. Um cristão não pode viver alheado dos desafios e dos problemas da sociedade em que está inserido. Quem pensa chegar ao céu, sem primeiro construir a terra, não chega ao céu. A fé não é só uma senha para se obter favores ou para se alienar do mundo, como Marx defendia, ou cumprir tradições e entregar-se a devoções. A fé é missão e compromisso, é uma visão da vida e do mundo, é construção do Reino de Deus, já aqui e agora na terra. Um cristão maduro e esclarecido deve viver comprometido com o mundo onde se encontra, tudo fazendo, participando activamente nas estruturas e movimentos, para que o espírito do Evangelho tome conta do rumo da sociedade, não deixando que forças malignas e desumanizadoras ou ideias nocivas para a família humana tomem conta da ordem do mundo.

 

Muitos alegam que o seu simples voto não muda nada. Não é bem assim. Uma pulga, na linha do comboio, não faz parar o comboio. Mas várias pulgas a morder o maquinista, e quantas mais forem melhor, fazem parar o comboio. O voto de todos opera mudanças. Dia 5 de Junho vão-se realizar as eleições legislativas. São das eleições mais determinantes para o nosso futuro. Por amor ao seu país, seja um cidadão responsável. Não deixe de exercer o seu direito e o seu dever de votar.

 

2. Tenho todo o respeito por uma das tradições emblemáticas do Barroso: a chega de bois. É talvez o ‘desporto’ mais apreciado em Barroso. Mas devia-se perceber que, em certos dias, não tem cabimento. Que dizer dos cristãos que no dia de Páscoa organizam chegas? Estamos a perder o sentido estético da vida: saber o que nos fica bem e o que nos fica mal. A Páscoa é a grande festa do Cristianismo. Convida a celebrar a ressurreição de Jesus Cristo com a família e os amigos. É dia de exultação e celebração. Não deve ser ocupado com distracções que nos desviem do essencial. É o dia do Senhor, e só dele e de mais ninguém. Que cristãos somos, afinal? Ou o nosso Cristianismo não passa de verniz? 

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