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minhas notas

05.05.11

 

 

 

 

A Igreja Católica lançou um catecismo para os jovens: o Youcat (abreviatura de Youth Cathecism, Catecismo jovem)). Um pouco por todo o mundo e dos vários sectores da comunidade eclesial choveram elogios quanto à iniciativa e à forma como o catecismo está estruturado, em esquema de perguntas (que foram colocadas pelos próprios jovens) e respostas, numa linguagem simples e directa, enriquecida com imagens e citações de grandes autores da tradição cristã. Marcelo Rebelo de Sousa, que proferiu uma conferência aquando da sua apresentação na Igreja S. João de Deus, em Lisboa, no dia 13 de Abril, afirmou que «é um salto qualitativo impressionante. Eu trabalho em comunicação social desde miúdo, quem trabalha em comunicação social tem a noção exacta do que isto significa. Isto é um salto qualitativo, foi como a passagem da televisão a preto e branco para a televisão a cores, isto é a mensagem evangélica com mais cores. Não é a três dimensões, é a várias dimensões».

De facto, são muitos os que reconhecem que a Igreja Católica reflecte bem e tem uma mensagem sólida relativamente às grandes questões da vida, mas falha muito na forma como comunica. Não chega ter uma boa mensagem, é preciso também saber comunicá-la. Com o Youcat, é notória uma grande melhoria, apresentando aos jovens os principais conteúdos da fé cristã de forma viva e dinâmica, mais adaptada à sua linguagem e sensibilidade, com um grafismo moderno.

A ideia deste catecismo para jovens nasceu por altura da elaboração do Catecismo da Igreja Católica (anos 80 e 90), presidida pelo actual Papa Bento XVI, então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, a pedido de João Paulo II. Diz Bento XVI no prefácio: «tornámo-nos ainda mais conscientes de que o texto (o Catecismo da Igreja) necessitava de traduções nos diferentes mundos vitais, para aí tocar as pessoas nos seus próprios pensamentos e questões». Não havendo tempo a perder, um grupo de padres, teólogos e professores de religião, sob a orientação do Arcebispo de Viena, Christoph Schönborn, organizou um catecismo direccionado para a evangelização da juventude, facto que será marcante na história da Igreja. A razão do seu nascimento é mesmo essa: «o Youcat, um catecismo para os jovens, é mais uma página dessa ousadia: levar os jovens, numa linguagem mais compreensível, a aprofundar a fé da Igreja, lendo de novo e de maneira nova o Catecismo da Igreja Católica. É o reconhecimento claro de que há uma cultura jovem, onde as novas linguagens exercem importância decisiva. Só a fé da Igreja, com a grandeza de uma Tradição, ajudará os jovens, sem se negarem ao confronto com esse universo apaixonante, a construírem solidamente a sua identidade cristã», escreve D. José Policarpo, no posfácio. Será o catecismo jovem oficial da Jornada Mundial da Juventude, que se realizará em Madrid, entre os dias 16 e 21 de Agosto.

Será este catecismo só para os jovens? Primeiramente, sim. De alguma forma, visa colmatar a lacuna, que a Igreja sente há muito, da falta de formação para os jovens que concluíram os 10 anos de catequese. Até à adultez, não tinham nenhum subsídio direccionado só para eles, que os ajudasse a aprofundar mais a sua fé. Mas também é um catecismo que qualquer cristão pode e deve ler, ainda para mais quando é inquestionável a formação débil e incipiente de muitos cristãos.

Estará a juventude receptiva a esta iniciativa da Igreja Católica? O Papa Bento XVI não tem qualquer dúvida: «muitas pessoas me dizem: os jovens hoje não se interessam por isso. Duvido de que isto seja verdade e estou certo do que digo. Os jovens de hoje não são tão superficiais como se diz deles. Eles querem saber realmente o que é a vida». Partilho do optimismo do Santo Padre, mas alguns laivos de pessimismo perpassam-me pelo espírito. Um bom grupo de jovens cristãos exulta. Mas uma grande maioria não manifestará senão indiferença. E passo a explicar porquê.

Muitos cristãos, nos últimos tempos, lamentam a ausência de jovens nas celebrações e na vida da Igreja. Eu costumo responder que se não os obrigassem a ir à escola, nem na escola os tinham. A nossa juventude está muito apática e muito afastada do essencial da vida. Ninguém se lembra de perguntar pelos pais. Se estes não vão à Igreja, como é que os filhos lá podem estar? Como é que um jovem pode crescer na fé e ter encanto pela fé, se o seu pai e a sua mãe não rezam, não falam de Deus, não vão à missa e não fazem vida de Igreja? A ausência da juventude na vida da Igreja deve-se ao triste exemplo de muitos pais, que não vivem a fé como disseram que iam viver, olvidando os compromissos que celebraram com Deus e com a Igreja. Mas como isto não dá prisão, deixa-se andar. A Igreja não deixa de ter as suas culpas. Nem sempre soube ir ao encontro dos jovens e integrá-los da melhor forma, motivando-os para uma vivência adulta e comprometida da sua fé, entendida como uma relação viva com Jesus Cristo e não como um cumprimento de mandamentos e de ritos sem mais nem menos. Fala-se demasiado de dever e obrigação e pouco de amor e de liberdade. A fé cristã, por vezes, mais parece um conjunto de regras e imposições, senão mesmo até uma ideologia, do que um encontro e uma caminhada libertadora com Jesus Cristo. E quanto a isto, repare-se no testemunho de muitos cristãos. Mas a Igreja só em si não justifica tudo. Os clubes de futebol tem estádios velhos e quase sempre os mesmos métodos de treino e não faltam jovens que queiram fazer parte das suas equipas. O grande problema está nas famílias, que não motivam, não integram e não testemunham.

Por outro lado, os grandes educadores dos jovens, que são a televisão e a internet (não são os pais, que dizem que têm muito que fazer) veiculam uma cultura secularizada, individualista, relativista e libertária, altamente superficial, e até mesmo agressiva, quanto à vivência religiosa e à sensibilidade para com o sagrado. A grande maioria dos jovens não conhece a Igreja Católica por dentro e qual é a sua mensagem, só sabe que é contra isto ou contra aquilo ou que é assim ou assado, deixando-se ir na onda das críticas da moda, não se apercebendo de que há quem os queira manipular e usar a seu bel-prazer. O que mais me custa ver actualmente é que as pessoas, e sobretudo os jovens, não pensam, não reflectem, não questionam o que todos os dias lhes entra pelos olhos adentro, não buscam a vida com mais profundidade, chafurdando acriticamente na trampa cultural que a democracia lhes proporciona. Sinal desta cultura que não pensa é andar sempre com os auscultadores nos ouvidos. Ruído a toda a hora. Nada de pensar, que é uma seca. Há que ir curtindo e entretendo-se. Vivemos na cultura do sensitivo e do entretenimento. Dá-se valor ao que causa emoção e não àquilo que faz pensar. Gostaria de os ver questionar esta cultura, de que eles são mais vítimas do que autores, que os torna jovens que vivem uma vida sem sentido, secos e vazios por dentro (quantos engravatadinhos não andam por aí, muito bem formatados para a profissão que exercem, mas sem princípios e convicções por dentro). Gostaria de os ver questionar a concepção de vida que lhes vendem a toda a hora, de que a vida é só direitos e não deveres, de que a exigência é para os outros e não para eles e que tudo tem que ser como eles querem. A vida não é assim.

Veremos os verdadeiros frutos que o Youcat irá produzir. Acredito que serão muitos. Mas vai cair em campos heterogéneos e muito pouco trabalhados. Quem sabe senão chegou mesmo até na hora certa, para muitos jovens descobrirem a fé. Está na hora de os jovens darem um abanão no facilitismo, na futilidade e na banalidade que lhes são propostas a todo o momento, buscando o sentido e a verdade última da vida. Bento XVI é claro: «tendes de saber em que credes. Tendes de conhecer a vossa fé como um especialista em tecnologia domina o sistema funcional de um computador. Tendes de a compreender como um bom músico entende uma partitura. Tendes de estar enraizados na fé ainda mais profundamente que a geração dos vossos pais, para enfrentar os desafios e as tentações deste tempo com força e determinação». 

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