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minhas notas

19.09.23

Em agosto de 1907, o general inglês Robert Baden-Powell, carinhosamente tratado entre os escuteiros por B.P, decidiu avaliar um novo modelo de educação integral dos jovens rapazes. Levou um grupo para a ilha de Brownsea, no sul de Inglaterra, e, durante alguns dias, levou a cabo um conjunto alargado de atividades e observou como os jovens interagiam em patrulhas. As ações decorreram de forma muito positiva, e, em janeiro de 1908, B.P escreveu um conjunto de fascículos que mais tarde se agrupariam num livro chamado “Escutismo para Rapazes”. Assim nascia o movimento escutista e as orientações que lhe dariam alma e vida.

Encantado com a presença e o desempenho de um grupo de escuteiros que participou num congresso eucarístico em Roma, em maio de 1922, D. Manuel Vieira de Matos, Arcebispo de Braga, e o seu secretário, Monsenhor Avelino Gonçalves, regressados a Portugal, decidem lançar as bases para o nascimento do escutismo em Portugal. No dia 27 de maio de 1923 nasceria em Braga o Corpo Nacional de Escutas, atualmente a maior associação de jovens do país com cerca de 70 mil associados. No dia 27 de maio celebrou-se em Braga o seu centenário.

Não fui escutista nos tenros anos da minha vida, possivelmente tê-lo ia sido se o movimento existisse no meu torrão natal, só descobri o escutismo como seminarista maior no Porto e agora como assistente de um agrupamento de escuteiros. Por aquilo que o movimento oferece, recomendo vivamente às famílias para que inscrevam os seus filhos no Escutismo. E neste campo as notícias até são muito boas: no último ano, entraram para o movimento 10 mil novos escuteiros.

No contacto com a natureza, o escutismo transmite valores fundamentais para a vida e oferece uma dinâmica que está no centro da vida: o agir e trabalhar com os outros, em grupo. Favorece a aquisição de competências humanas importantes num ser humano, como a organização, a ordem, a disciplina, a responsabilidade, o espírito de serviço e o amor e respeito pelo outro. E como afirma o seu assistente nacional, o Pe. Luís Marinho, o escutismo ajuda a centrar a vida no essencial, num tempo marcado pelo acessório.

A minha sincera homenagem aos bons dirigentes, que dão e deram abnegadamente boa parte da sua vida ao movimento, e que lhe deram vida, solidez e dinâmica nestes 100 anos. Num tempo em que vemos jovens e crianças absortos na doentia atração tecnológica e a definhar no individualismo e na solidão, seria bom inscrevê-los no escutismo.  

19.09.23

Por estes dias, foi conhecida a aprovação da mina de lítio de Barroso pela Agência Portuguesa do Ambiente, aprovação, no entanto, condicionada, com algumas exigências, que deverão ser executadas para que o projeto possa a avançar e a mina possa operar.  Nomeadamente, exige a construção de uma estrada, para ligar a mina à A24, para que “todo o minério que vai ser produzido seja desviado das populações”, tem de se limitar as zonas desflorestadas e não se pode usar a água do rio Covas. As empresas envolvidas afirmam que assim se vai fazer uma exploração de minério com impactos sociais e ambientais reduzidos. A ver vamos como é que estas exigências vão ser cumpridas, onde se vai buscar água para este mastodôntico projeto mineiro.  

Assim se dá razão à contestação que tem sido feita, que tem merecido a repulsa de muitos geólogos, economistas e políticos, apelidando os opositores ao projeto de velhos do restelo, antiprogressistas, ingénuos naturalistas da moda, inimigos do crescimento e desenvolvimento do país, perdedores acéfalos de oportunidades, egoístas que querem o progresso sem consequências. A verborreia capitalista que muitos bons serventes sabem bem servir nos órgãos de comunicação social e proferir em oportunas e patrocinadas conferências e debates. Perante o que inicialmente se propunha e ainda se propõe, mau seria que o povo local, desde a primeira hora, não defendesse a sua memória, a sua terra, o seu bem-estar, a sua riqueza e o futuro da sua terra, e tem toda a razão de ser que o continue a fazer.  

Na minha singela opinião, como amante da minha região, que dignamente foi glorificada e prestigiada com a nobre categoria de património agrícola mundial e reserva da biosfera, é preciso sensatez e razoabilidade em todo o processo. O lítio é um mineral fundamental para a tão almejada e premente transição energética, que está em marcha acelerada no mundo, têm de se promover mudanças para se salvaguardar o futuro do planeta e da humanidade, mas a exploração de lítio também não se pode fazer a qualquer preço e no desrespeito pelas populações e pela riqueza natural. Alguns destes projetos poderão ter uma duração muito curta, deixando atrás de si uma grande destruição paisagística e graves danos para o futuro e para a qualidade de vida das populações afetadas. A troco dos avaros lucros e rendimentos imediatos, que a bulímica e insaciável voragem capitalista reclama, pode-se deixar uma herança pesada e tenebrosa em algumas regiões do país.

19.09.23

Obrigado a ir para a reforma e a deixar de dar aulas na universidade, o Professor catedrático, Eduardo Paz Ferreira, desabafou: “É uma violência as pessoas serem obrigadas a deixar o trabalho por causa da idade. Temos fenómenos como o racismo, como o sexismo e temos também este fenómeno (idadismo) da discriminação em relação aos mais idosos, que se considera que já não têm valia e que lhes resta ir tratar dos netos”. E dá o exemplo do Papa Francisco, que, apesar da idade, manifesta “uma energia e uma capacidade de intervenção altíssima”.

São muitas as formas como a sociedade de hoje discrimina os mais velhos e como está normalizado um certo saneamento inaceitável dos idosos, que têm de carregar a maldição de já terem vivido muito e de já serem um pouco “antigos”. E, de facto, não deveria existir a aposentação ou reforma obrigatória, para não dizer coerciva. Há muitas pessoas idosas que ainda continuam muito válidas, com uma saúde muito estável, podem ser muito úteis, têm uma sabedoria e uma experiência de vida que pode ser de capital importância para as instituições e a sociedade. São assim obrigados a sair de cena e são afastados da vida cívica, da vida profissional, correndo até o risco de se desinteressarem um pouco da vida.

Haverá sempre tensão entre jovens e velhos, entre as novas e as velhas gerações, mas é inadmissível que se condene e afaste as pessoas pela sua idade, normalizando-se um certo discurso tipo “já está na hora de arrumar as botas, está na idade de ir tratar dos netinhos, que vá cuidar do jardim”, e por aí fora, como se ser velho fosse crime e tenha de se arrumar num canto, porque já não faz falta e é um inútil. Haverá, certamente, pessoas que querem chegar à reforma e ir à vida delas, mas há outras, com saúde e vigor, que ainda querem continuar o seu trabalho e a exercer o seu ofício. As pessoas deveriam ser livres de tomar essa decisão.

No dia do funeral da sua mãe, D. José Tolentino Mendonça afirmou na homilia: “Olhem para os nossos idosos como uma força de vida muito grande, as pessoas idosas são um depositário de humanidade, de memória, de tradição de conhecimento de um modo de ver e discernir a realidade, isso é um tesouro muito grande. A velhice é também um recurso humano de que nós precisamos muito, para nos reconciliarmos mais profundamente com a vida, com aquilo que ela é”.

A idade não deve ser vista como um problema, nem um estorvo, mas como um bem, um tesouro, uma graça, uma mais valia para o equilíbrio da sociedade.

19.09.23

Há dias, o UNICEF recordou que a maioria das 800 mil pessoas que morrem por suicídio a cada ano são jovens e que o suicídio é a quarta principal causa de morte de jovens dos 15 aos 19 anos. Ficou o apelo para que se dê mais atenção e importância à prevenção e tratamento da saúde mental, que, em Portugal, por exemplo, ainda está subvalorizada e carece de um investimento digno. Há uma grande falta de programas direcionados e baseados em dados, capacidade de pessoal e financiamento sustentado para a saúde mental e apoio psicossocial para crianças, jovens e famílias. A pandemia também contribuiu muito para o declínio da saúde mental.

 É preciso intervir na saúde mental, é verdade, mas o suicídio entre os jovens é multifatorial e implica cavar fundo para se compreender o fenómeno. Há muitas causas familiares, sociais, humanas e espirituais que podem arrastar os jovens para o desencanto para com a vida, a começar pelas óbvias, como as frágeis condições de vida e de expectativas pessoais e sociais, mau ambiente familiar e más relações humanas. Mas quem tem dinheiro e riqueza também se suicida. Apontaria outras: o excesso de proteção com que são educadas as crianças na família e na escola, que favorece um infantilismo duradouro, com a consequente imaturidade humana e emocional, dificuldade em gerir emoções negativas e ultrapassar contrariedades e fracassos; o exigir-se altos rendimentos nas idades tenras da vida, com muitas atividades, ocupações e agendas muito preenchidas, sem tempo para a afetividade e para o gozo da vida.

 Culturalmente, temos uma sociedade onde já não se luta por nada, cujos valores reinantes são o consumismo, o hedonismo, a vaidade pessoal, o narcisismo, o exibicionismo e o sucesso imediato, valores que mais escravizam do que libertam e humanizam. O pior que estamos a fazer às atuais gerações é não fazê-las lutar por nada, falta-lhes a raiva e a insatisfação saudáveis. As muitas horas que passam em muita diversão fútil teria muito mais sentido em serem empregues em boas causas por si, pelos outros, pela sociedade e pelo mundo. As alterações climáticas, por exemplo, já as mobilizam, mas a muito custo. O culto da noite diz muito da forma como vive muita juventude: ausência de ideais e de projetos de vida sólidos, falta de sentido para a vida, inexistência de objetivos. A noite serve para abafar o vazio da vida. Podemos ainda juntar a ausência de vida espiritual e de valores espirituais, o desnorte moral em que vivemos.

19.09.23

Algumas editoras, pelos vistos muito vulneráveis às sensibilidades da sociedade atual, estão-se a dar ao trabalho de reescrever alguns livros, em nome de uma linguagem mais inclusiva e que não ofenda ninguém. Em muitos casos, os autores já morreram e deve perguntar-se se é legítimo mudar uma obra literária, ainda para mais numa época em que há excesso de zelo pelos direitos de autor. Proclamamos aos quatro ventos que já somos uma sociedade mais aberta e tolerante, e depois não conseguimos ler obras literárias que não estejam alinhadas com o ar dos tempos e com as nossas mentalidades!

Uma obra literária é um documento histórico, que reflete a linguagem e os valores da época. As obras literárias têm valor também porque nos contam um tempo, com a sua forma de pensar, as ideias dominantes, os seus conceitos e preconceitos. Os livros históricos e científicos estão sempre sujeitos a novas descobertas e a novos dados e estão sujeitos a atualizações e a reformulações, mas as obras literárias têm um cunho e uma identidade muito própria, são expressão de um escritor, que viveu no seu tempo e na sua circunstância.

Reescrever livros e mudar a sua linguagem reflete uma sociedade frágil emocionalmente, que se ofende por tudo e por nada, que não sabe viver com o contraditório, e que está vergada a uma ideologia dominante, que acha que tem o soberbo direito de purificar e higienizar tudo que não encaixe na sua esplendorosa forma de pensar e de ver a vida e o mundo. Por outro lado, significa uma promoção da infantilização das pessoas, que, afinal, coitadas, não sabem ler livros, não sabem contextualizar ideias e linguagens, não sabem ser críticas daquilo que leem, coitadas, temos de lhes fazer a papinha toda para não ficarem ofendidas. Se assim é, se não sabem ler livros que as desacomodam e questionam, que as fazem ter olhares diferentes e conviver com visões e sensibilidades diferentes, têm um bom remédio: ler os livros que vão de encontro à redoma em que vivem e querem continuar a viver, que as fecha no seu mundinho pequenino e cómodo em que querem viver, onde nada ofende a sua suprema sensibilidade. Fica o conselho do Senhor Francisco Louçã: “Se pensa que a sua criança vai ser protegida numa redoma de modo a nunca ouvir a palavra “gorda”, talvez tenha que a fechar em casa sem ver ninguém e sem nunca ler um livro.” Haja espírito crítico. Não é a riscar e a reformular aquilo que não gostamos de ler e ouvir que nos vai ajudar a crescer como pessoas.

19.09.23

Em boa hora se lembraram de lançar em Portugal a reforma do simplex, no intuito de simplificar processos e documentações, diminuir a enfadonha e labiríntica burocracia, descomplicar licenciamentos e autorizações, tornar a vida do cidadão mais simples e ágil. Já era tempo de se acabar com a impressão de que em Portugal há gosto pela complicação e pela confusão, é preciso passar estoicamente pelo calvário para se adquirir uma escritura, um subsídio ou um novo direito. Ainda persiste a ideia de que o Estado tem sempre gosto em complicar, enrodilhando o cidadão em decretos, leis e exceções de última hora, ou portarias acabadinhas de ver a luz do dia. Já agora, que o simplex chegue também à linguagem. Seria oportuno que em Portugal, neste momento, se fizesse um apanhado dos documentos que o Estado emite, nos seus muitos órgãos e organismos, e se cuidasse da linguagem, tornando-a clara, concisa, direta e simples para o cidadão.

Nos seus documentos, ou em boa parte deles, que religiosamente envia ao cidadão, o Estado nem sempre é claro e conciso, há excesso de palavreado, muitas vezes usa vocabulário caro e demasiado elaborado, obsoleto, até por vezes num português hermético e intratável. Alguns organismos do Estado têm uma comunicação deplorável, arcaica e soberba. Fica sempre no ar a sensação de que não há necessidade nenhuma de se comunicar desta forma e que é preciso melhorar e simplificar a comunicação do Estado. O Estado não tem nada a ganhar quando não comunica bem com o cidadão, e pior será se o faz para mostrar autoridade e altivez.

Até na Igreja se reclama que é preciso cuidar da linguagem, quer na oração, como no discurso, até mesmo nas tradições. A teóloga Cettina Militello alerta: “Acredito que, para a maioria das pessoas, a linguagem das nossas liturgias é no mínimo estranha, incompreensíveis antigas e belas metáforas. Seria preciso pelo menos um tradutor.” Talvez a teóloga esteja a ser excessivamente crítica, têm sido feitas boas reformas litúrgicas. A linguagem da liturgia também não pode ser simplista e corriqueira, tem de nos falar de Deus e da sua beleza. Ainda assim, a clareza e a simplicidade de Jesus são sempre exemplo a seguir. O Cardeal Matteo Zuppi adverte: “A Igreja não deve perder as tradições, mas também não deve tornar-se um museu. Deve comunicar com os indivíduos de hoje; o risco é que fale uma língua que não se entende ou, ao contrário, que nada diga.” Temos de recriar e dar novas roupagens às nossas tradições.

19.09.23

Vivemos num tempo de chavões e slogans. Vêm muito ao encontro deste tempo, que gosta de andar pela rama, que não deseja pensar muito e quer comunicações curtas, que quer tudo muito rápido e instantâneo. Segundo se ouve, já não há paciência para vídeos longos, nem para artigos compridos, mas para se ver futebol a tarde toda ou passar uma noite a ver séries há todo o tempo do mundo.  Sempre foi e será assim: a cultura e ser culto dá trabalho, mas é um trabalho que interessa a uma minoria, que depois é admirada pela maioria. Estamos no tempo dos chavões. Depois de um estar gasto, vem outro. Bate-se palmas e salta-se de alegria. Mas quem se dá ao trabalho de os aprofundar e compreender?

Muita gente ficou deslumbrada com algumas frases do Papa Francisco, que, em abono da verdade, não foram uma novidade. O Papa Francisco não disse nada de novo que já não tenha vindo a dizer desde o início do seu pontificado. O que agora está a gozar os seus 15 minutos de fama é o “Todos, todos, todos”. Anda por aí citado, agora, até à exaustão. Não vejo qual foi a surpresa. Jesus no Evangelho manda anunciar o Evangelho a toda a criatura, todos estão abrangidos pelo amor de Deus e todos são chamados ao seguimento de Jesus Cristo, ninguém está excluído, e são vários os textos bíblicos que salientam a universalidade da salvação de Deus. A Igreja está destinada por Deus a ser uma casa de portas abertas e acolhedora para todos desde sempre. Bem sabemos, ou desconfiamos, que o Papa se sentiu obrigado a proferir aquela frase por causa das tensões que tem sentido com os setores mais conservadores e tradicionalistas da Igreja, que não aceitam alguns processos e caminhos propostos pelo Papa e a integração que está a dar a grupos considerados desviantes, e o Papa já está a perceber que o próximo sínodo da Igreja não vai ser fácil. De alguma forma, o Papa lança o apelo a se pensar, acima de tudo, mais na pessoa humana e não na doutrina, mais na unidade na diversidade da Igreja, mais no amor, menos no poder e na ideologia.

Já andam por aí mal-entendidos. Não se pense que este todos, todos, todos, é um convite a sermos uma Igreja sem critérios e sem valores, uma amálgama sem exigência, com tudo e o seu contrário, onde cada um vive como quer e faz o que quer, onde há tolerância para tudo, onde vale tudo. A Igreja é mistério de comunhão, mas uma comunhão exigente, que exige a conversão de todos, seguir Jesus Cristo e acolher o seu Evangelho. Estarão todos para aí virados?

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