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minhas notas

22.08.22

O sacerdote jesuíta Javier Melloni deu uma entrevista ao expresso, onde conta um pouco da sua experiência pessoal mística, musculada e aprofundada nas práticas e sabedoria orientais, mais concretamente na Índia, como a meditação e o ioga, e aborda alguns temas da vida da Igreja. Define-se como um monge peregrino. Vive há 25 anos no Santuário de Manresa, Catalunha, onde S. Inácio se terá refugiado para se dedicar à oração. Algumas frases chamaram a minha atenção e penso que são úteis para a reflexão da Igreja.

“Na Índia, dão às pessoas uma experiência do absoluto e não uma doutrina.” A nossa vivência cristã assenta muito na intelectualização da fé, doutrinação, catequese, pregação, dogmas, fórmulas; depois, estabelecemos uma disciplina de ritos, sacramentos e práticas, regras, permissões e proibições, criámos o cristão “cumpridor”; por fim, exige-se um testemunho do que se ensina e celebra. Damos pouca atenção e importância à experiência que os cristãos fazem de Deus.  

“A sociedade secular avançou e nós em muitos casos fossilizámos. Temos muitos medos. A Igreja tem medo de perder poder, de tocar em algo sagrado da tradição. A tradição é transmissão e não repetição. Cada geração tem de ter coragem de discernir o que é adequado para o seu tempo.” Negar o sacerdócio às mulheres em nome da soberana tradição é incompreensível.

“Uma Igreja feita por celibatários não sabe questionar a sexualidade. Há desconhecimento, medo e obsessão. A sexualidade é uma das energias da vida, é por onde nos vem a vida, mas tem tanta força que não sabemos o que fazer. Ao temê-la, reprimimo-la, e ao reprimirmo-nos torna-se uma obsessão.” Já é tempo de a Igreja apresentar uma nova proposta de moral sexual, de a olhar de forma descomplexada e positiva, não lhe atribuir uma maldição e toda a espécie de pecado.

Sobre a pandemia, Melloni afirma: “Não, ainda não aprendemos, e virão mais emissários, mas adaptámo-nos melhor do que pensávamos. Mas não nos transformámos. Adaptar não é transformar.” Pensei que a pandemia nos iria transformar para melhor, mais abertos a Deus e humanos e solidários com os outros e com o mundo. Ainda não foi desta.

Por fim, Melloni afirma sobre a Igreja: “O resto é uma concentração minoritária que contém a essência e o resíduo é algo morto, as sobras sem substância. É verdade que somos hoje uma minoria, mas somos uma minoria residual ou uma minoria essencial?” A Igreja é uma minoria. Autenticidade e regresso ao Evangelho é o caminho.

22.08.22

Facilmente se ouve hoje aplicar, em muitas e variadas situações, a fórmula ninguém deve julgar ninguém ou quem não tem pecados atire a primeira pedra. Muito bem. No entanto, no fim da cena evangélica, Jesus não deixa tudo na mesma e diz à mulher: ninguém te condenou? Eu também não te condeno. Vai e não tornes a pecar. Não deixou de fazer ver à mulher que aquilo que andava a fazer estava errado e era pecado e pede-lhe mudança de vida. Não julgar não é ser acrítico ou permitir tudo.

Esta ideia de se fazer de Jesus um bonacheirão e um observador acrítico, que só apelou ao acolhimento e respeito por todos, sem um olhar crítico sobre a vida pessoal e social, não condiz com Jesus. Ele foi profundamente crítico da vida social e religiosa, de muitos comportamentos e atitudes e de muitos abusos e injustiças do seu tempo, e diante do pecado, ou seja, daquilo que estava errado, reclamou mudança. E pediu aos seus discípulos para fazerem correção fraterna, não devemos apenas ser espectadores da vida e dos outros, mas contribuir para o seu aperfeiçoamento e para a sua humanização e santificação.

A nossa primeira atitude deve ser acolher e respeitar os outros, com a sua maneira de ser e de pensar, com a sua identidade, diferença e cultura próprias, com o seu corpo e a sua originalidade, com as suas virtudes e fragilidades, com os seus feitos e fracassos. Mas não podemos deixar de ter sempre um olhar crítico, no bom sentido da palavra, sobre nós mesmos, sobre os outros, sobre a vida e sobre o mundo, e de nos perguntarmos sobre o que é mais digno ou indigno, mais correto e menos correto, mais certo ou menos certo, mais humano ou menos humano. O julgamento construtivo faz parte da vida. O não julgar também não pode ser carta branca para a libertinagem, para cada um fazer o que quer e para se permitir o mal, excessos, desleixos, errâncias, atropelos, vícios, abusos, aberrações e loucuras.  Na verdade, o que vejo, muitas vezes, em muitas situações em que se reclama o não julgamento, é indiferença, o querer que tudo continue sempre na mesma e que ninguém seja perturbado na sua vida, mesmo que esteja a viver de forma abusiva ou errada. Um não julgar para sermos tolerados e nos ser permitido fazer tudo o que nos apetece.

Vermos o mal e acharmos que está mesmo mal e não confrontarmos os outros com isso, em nome do não julgar, não é uma atitude saudável para a vida de todos e não é contribuir para o bem dos outros e da sociedade.

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