09.02.17
A Igreja Católica passou a ter mais uma santa oficial: Santa Teresa de Calcutá. Mais uma intercessora e um exemplo do Evangelho que é apresentado à devoção do povo de Deus. Costuma-se dizer que as palavras convencem, mas os testemunhos arrastam. Tem muito mais força um bom exemplo de vida do que rebuscada e espaventosa oratória, que se fica muito pelas boas intenções. Mesmo o nosso povo gosta de dizer que é preciso dar os bons conselhos. Sem dúvida, mas quem os dá que os testemunhe com a sua vida. Coloquemos os olhos e o coração no testemunho de S. Teresa de Calcutá. Também disse muitas coisas interessantes, mas fala sobretudo pela sua prática e pela sua vida.
De etnia albanesa, nasceu na Macedónia, numa família católica. Depois de uma breve passagem pela Irlanda, mudou-se para a India. Por lá ficou o resto da sua vida, sendo primeiro professora, passando depois a viver nas zonas mais pobres da cidade de Calcutá, tocada por um apelo veemente de Deus a cuidar daqueles que não importavam nem interessavam a ninguém: os miseráveis, os abandonados, os doentes e deserdados. Construiu hospitais, casas de repouso, cozinhas, escolas, colónias de leprosos e orfanatos para todos estes necessitados. Morreu no dia 5 de setembro de 1997, com 87 anos. É considerada a grande missionária do século XX. Foi beatificada em 19 de outubro de 2003, porque, nas palavras do Papa João Paulo II, foi um «Ícone do Bom Samaritano, ela ia a toda a parte para servir Cristo nos mais pobres entre os pobres». Em pleno pontificado do Papa Francisco, recebeu a canonização no dia 4 de setembro de 2016. O Papa destacou que «Madre Teresa, ao longo de toda a sua existência, foi uma dispensadora generosa da misericórdia divina, fazendo-se disponível a todos, através do acolhimento e da defesa da vida humana, dos nascituros e daqueles abandonados e descartados. Comprometeu-se na defesa da vida, proclamando incessantemente que «quem ainda não nasceu é o mais fraco, o menor, o mais miserável». Inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira da estrada, reconhecendo a dignidade que Deus lhes dera; fez ouvir a sua voz aos poderosos da terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes ― diante dos crimes! ― da pobreza criada por eles mesmos». Ficou conhecida como a «santa das sarjetas» e também como «a serva ou santa dos pobres». Em 1950, fundou a congregação religiosa das Missionárias da Caridade, espalhada já por muitos países. No dia 17 de outubro de 1979 recebeu o prémio nobel da paz.
A pobreza continua a ser fonte de muitos santos e santas. Esta e outras canonizações da Igreja Católica não podem deixar de nos sobressaltar e de despertar em nós o desassossego, porque põem a nu a nossa incoerência, praticamos muito pouco os belos discursos que fazemos sobre os pobres e a pobreza, persistindo a indolência, o egoísmo, a indiferença e a resignação, e não podemos deixar de constatar que fazemos muito pouco para atacar as causas que ainda continuam a empurrar muitas pessoas para a valeta da vida, sendo condenadas a viver uma vida sem o mínimo de dignidade.
Concluo com dois episódios da sua vida. Conta o Cardeal Ângelo Comastri: «A Madre Teresa olhou-me com dois olhos límpidos e penetrantes. E, logo de seguida, perguntou-me: ‘Quantas horas reza por dia?’. Eu fiquei surpreendido com essa pergunta e tentei defender-me dizendo: ‘Madre, da senhora eu esperava um chamamento à caridade, um convite a amar mais os pobres. Por que me pergunta quantas horas eu rezo?’. A Madre Teresa agarrou as minhas mãos, apertou-as entre as dela, como que para me transmitir o que lhe ia no coração, e segredou-me: ‘Meu filho, sem Deus nós somos pobres demais para ajudar os pobres! Lembre-se: eu sou apenas uma pobre mulher que reza. Rezando, Deus coloca o Seu amor no meu coração e assim eu posso amar os pobres. Rezando!»
Madre Teresa de Calcutá recebeu em Oslo, Noruega, em 1979, o Nobel da Paz. No regresso, passou por Roma, onde recebeu jornalistas, um dos quais lhe perguntou com uma pontinha de intriga: «Madre, a senhora tem setenta anos. Quando morrer, o mundo será como antes. O que mudou depois de tanto esforço?» Madre Teresa respondeu com um sorriso: «Nunca pensei que poderia mudar o mundo! Eu só tentei ser uma gota de água limpa em que pudesse brilhar o amor de Deus. Acha pouco?». O jornalista emudeceu e Madre Teresa acrescentou: «Tente ser também uma gota limpa e, assim, seremos dois». «É casado?», insistiu Madre Teresa. «Sim, madre.». «Peça também à sua esposa, e assim seremos três. Tem filhos? «Três, madre». «Peça também aos seus filhos e assim seremos seis».
Já no fim da sua vida, sentenciou: «Se eu alguma vez vier a ser santa, serei com certeza uma santa da escuridão. Hei-de estar permanentemente fora do céu a iluminar os que na terra se encontram na escuridão». Na escuridão estão aqueles que fecham os olhos e gelam o coração diante dos problemas e das necessidades dos muitos irmãos pobres que encontram pelo caminho da vida.