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minhas notas

21.06.13

Desde há uns tempos para cá que tenho seguido com interesse as conferências ou as sessões da TED, que já muitos devem conhecer. A TED é uma fundação privada americana, fundada em 1990 por Richard Saul Wurman, com o fim de divulgar ideias interessantes. Durante 18 minutos, um conferencista convidado apresenta uma ideia com valor ou originalidade, conferências que estão no Youtube. Uma, de que gostei e que me deixou a pensar, foi a de Ken Robinson, inglês nascido em Liverpool, em tempos consultor internacional em educação nas artes para o governo britânico e professor de educação artística. A sua tese é a seguinte: as nossas escolas matam a criatividade humana, com tudo o que isso traz de infelicidade para a pessoa humana, e formatam as pessoas para o mundo do trabalho, desprezando a sua riqueza humana e artística. Na sua opinião, a criatividade é tão importante como a alfabetização. Acho a tese interessante e provocadora.

O conferencista começa por contar a história de uma menina, que habitualmente não manifestava grande interesse pela aula de desenho, ficando no fundo da sala, mas, num certo dia, a professora notou o seu empenho. E perguntou-lhe: «O que estás a fazer?». A menina respondeu: «Estou a fazer um retrato de Deus». A professora, talvez sorrindo, respondeu: «Mas ninguém sabe como Deus é». Ao que a menina respondeu: «Vão saber num minuto». Daqui Ken Robinson conclui, e com razão, que a pessoa humana nasce com criatividade e sem medo de errar e de ser original, de inovar e de evoluir, sem medo de assumir riscos, e que quando não estamos preparados para errar não temos ideias originais. Reforçou isto mesmo lembrando Picasso que afirmou que todas as crianças nascem artistas e que o problema é continuar artista enquanto se cresce. Somos ensinados a abandonar a criatividade, considerada um estado de imaturidade. Conforme nos vamos tornando adultos vamos perdendo a capacidade de inovar e adquirimos o medo de errar. Estigmatizamos o erro, entendido como a pior coisa que nos pode acontecer ou que podemos cometer. Em grande parte da sua atividade, as nossas escolas produzem indivíduos desprovidos de criatividade e formatam-nos para o mundo laboral e para a produção da riqueza, para o seu «papel funcional» da sociedade, onde devem atuar como meros instrumentos de uma engrenagem. Assim, na sua opinião, tem-se deitado por água abaixo muitos talentos e muita originalidade que poderia dar outra beleza à vida humana.

Ken Robinson acrescenta depois dois dados importantes: não havia um sistema de educação pública antes do séc. XIX e que este nasceu para suprir as necessidades da industrialização. Assim se construiu a hierarquia das disciplinas escolares, universal em todas as escolas: em primeiro lugar matemática e línguas, em segundo as ciências humanas e no fundo as artes. O ensino centra-se na cabeça e despreza o resto do corpo. Tudo o que tem a ver com o trabalho é a prioridade do ensino. Não tem de ser assim? Ken Robinson acha que não e que a escola não devia ter só este sentido único, ou se quisermos, esta ditadura, mas que devia dar espaço para cada um conhecer e aperfeiçoar os seus talentos, com criatividade, onde pode ser brilhante, e não ser aniquilado para uma função ou um papel laboral onde não se realizará e onde não será feliz. Confesso que partilho muito destas ideias.

Em tempos, lembro-me de ter lido um artigo do médico, professor e pintor Abel Salazar, onde ele criticava o ensino do seu tempo, em que o bom aluno era considerado aquele que decorava tudo e que debitava tudo o que o professor lhe ensinava, sem qualquer atitude reflexiva e crítica em relação ao saber e ao conhecimento. Para ele, o bom aluno é aquele que questiona o conhecimento e procura aprofundar e inovar o conhecimento, com reflexão e criatividade. O bom aluno é aquele que assimila para ser um criador. Lembro que a palavra escola vem do grego e significa ócio. Já os gregos entendiam a escola como o lugar para o homem se formar e humanizar, se desenvolver e realizar as suas capacidades e potencialidades, se recriar para ser um criador e um inovador. É preciso talvez refundar as nossas escolas por este caminho, porque, infelizmente, hoje em dia, ter um canudo já não significa entrar no mundo do trabalho. O homem tem na inteligência o seu maior dom, mas é mais do que inteligência. Tem um corpo onde habitam muitos outros dons, que também o realizam como homem. A escola deve ter uma visão mais completa da pessoa humana e centrar-se na sua riqueza global. É preciso focalizar mais a escola na realização da pessoa humana e não no mundo do trabalho.  

06.06.13

Dois equipamentos ou instrumentos marcam a vida contemporânea: a televisão e o computador. Este revolucionou a nossa capacidade de organização e de trabalho, proporcionou-nos uma comunicação muito mais célere e eficaz, aproximação e construção de redes transversais e globais, para lá do muito lazer que também oferece, sempre à mão com meia dúzia de cliques. A televisão tornou-se a grande animadora dos ambientes sociais e dos serões familiares. Ou até mais do que animadora: a televisão é hoje, em muitas casas, o pão intelectual e a grande formadora das consciências, formatando os hábitos, valores e comportamentos de uma grande massa social.

Passamos muito tempo diante da televisão. Rendemo-nos excessivamente à televisão. Tornámo-nos consumidores de televisão, sem critério e consciência crítica. Isto tem algum mal? Claro que tem. As pessoas deixaram de dar tempo a atividades e ações muito mais enriquecedoras para a sua vida, como ler bons livros, dar tempo a associações e a instituições, dar tempo aos outros, cultivar a amizade, o encontro e a partilha, a exploração da criatividade e de dons e talentos profícuos para a vida social e comunitária, entre outros. E tem, sobretudo, devido ao produto que a televisão oferece, que, na sua maioria, é de média e má qualidade. Compreendo que a televisão também é para entreter, mas, na sua base, não temos uma televisão responsável e exigente, com critérios educacionais, culturais e formativos bem vincados, inspirados na excelência da humanização e da socialização, mas temos uma televisão regida pela mínima preocupação ética e cultural, obcecada por audiências a qualquer preço, geradoras de dinheiro. A televisão oferece muito lixo às pessoas e muitas pessoas não têm suficiente espírito crítico para saberem questionar e recusar a lixeira que lhes oferecem, deixando-se estar anestesiadas e atónitas diante da televisão, adormecidas num entretenimento que pouco ou nada lhes acrescenta à vida. Daqui advém, claro, uma sociedade pouco culta, sem ginástica intelectual, inerte, indiferente, viciada na facilidade e no comodismo. Vivemos numa sociedade dependente da televisão. Tornou-se mesmo um sedativo para ajudar a passar o tempo e a adormecer, sem acrescentar mais cultura e educação à vida das pessoas.

Reparemos até nas causas e nos efeitos do zapping (passar de uns canais para os outros para ir passando o tempo), que, em algumas pessoas, é uma dependência. Tudo nos interessa e nada nos interessa. Sem qualquer objetivo e referência, absorvemos uma cascata de sons, sensações e imagens, numa voracidade tonta por tudo e por nada, captando tudo pela rama, na falsa perceção de que estamos atualizados com o mundo, quando não estamos. No fim, não fica senão uma grande inquietação interior e um grande descontentamento, porque nada ou quase nada interessou, nada ficou para a vida, não se deu dinamite à inteligência e sobressaltos ao coração, tudo foi um passar de tempo entediante, que de forma insuspeita, vai tornando as pessoas sem gosto por nada, amorfas e apáticas, abúlicas e crestadas. Parece um diabético a contemplar um sortido de doces.

Já aqui o disse mais do que uma vez a impressão, que já é uma convicção, que tenho dos tempos atuais: tem-se muita informação para não se saber nada ou quase nada. A informação entrou na órbita do consumismo. Devoram-se notícias e mais notícias, anda-se avidamente atrás de novidades e mais novidades, mas não se questiona e analisa e não se faz uma triagem e uma síntese, porque faltam alicerces e referências, de forma que pouco saber e pouca sabedoria se adiciona à vida. Vivemos numa cultura vaporosa e líquida, que gosta que tudo seja intenso, mas rápido, que nada se firme e que tudo corra, em nome de uma avidez vaga, que não sabe o que quer e para onde quer ir. Até os debates televisivos já nem formam nem informam, porque o que interessa é ganhar a luta e dominar o espetáculo do debate e não esclarecer e apontar caminhos e soluções da parte de quem abarca o saber.

Repensemos o tempo que damos à televisão. Muito desse tempo é tempo perdido. O quadradinho mágico há muito que deixou de o ser. Uma televisão assim faz-nos pouca falta. 

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