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minhas notas

21.12.12

Já não deve haver português que não tenha ouvido falar do P. Fernando Guerra, um barrosão natural de Gralhas, atual pároco de Viade, Fervidelas, Contim, Fiães do Rio e Paradela do Rio. Todos os telejornais televisivos e a maioria dos sites de jornais se deram ao luxo de publicar qualquer coisa sobre a sua pessoa e sobre a sua vida, por norma, a roçar o mau gosto, a coscuvilhice, a calúnia e o achincalhamento. O que é que despoletou tanta logorreia? Segundo diz a imprensa, e é o único dado relevante a reter, o P. Fernando Guerra está ser investigado pela Polícia Judiciária por branqueamento de capitais, no valor de 5 milhões de euros, servindo-se, para o efeito, das contas das Comissões Fabriqueiras onde era pároco. Se é verdade ou mentira, não sei, e desculpem esta minha pessoalização. Só o P. Fernando é que o saberá, e se a polícia judiciária diz que é verdade, tem de apresentar as devidas provas. E apure-se a verdade. A justiça faça o seu trabalho. Mas reparem bem na situação: o P. Fernando simplesmente é suspeito. Não vem nenhum mal ao mundo por se estar a ser investigado. Pode ser um grande equívoco. Mas, infelizmente, em Portugal não se separam bem as águas e faz-se passar a ideia, com muita parcialidade, que ser suspeito já é ser culpado e que ir a tribunal já é uma perda de tempo porque «já não nos engana». E quantos inocentes (não estou a dizer que é o caso) são assim queimados nas grelhas impiedosas e injustas da opinião pública. Nem sempre a voz do povo é a voz de Deus. Dados concretos, até agora, sobre a suspeição que pesa sobre o P. Fernando? Nada.

Tudo isto vem no seguimento de um processo grávido de poucas verdades e muitas mentiras que tem acompanhado o P. Fernando nos últimos anos, com montagens muito bem feitas e o aparato que uma boa parte da imprensa medíocre e da sociedade gosta. Lembremo-nos do triste espetáculo que foi a sua detenção, aqui há uns tempos. Trinta homens da Guarda Nacional Republicana para deterem um homem de setenta e tal anos, depois da Missa Dominical. Era preciso tanto? Será o P. Fernando um criminoso de alta perigosidade? Não me parece. Houve intenção de causar impacto e de humilhar? Sou tentado a pensar que sim. Juntamente com o P. Fernando, foram detidas mais algumas pessoas por posse ilegal de armas e de outros crimes. Alguém se importou com isso? As televisões difundiram imagens com as apreensões de armas e munições que foram efetuadas. A esmagadora maioria do que se via não pertencia ao P. Fernando, mas sim às outras pessoas que foram detidas. O que passou injustamente para a opinião pública foi que o P. Fernando tinha um arsenal em casa, o que não corresponde minimamente à verdade. Porque é que não se informa como deve ser?

Acusado em tribunal, saiu a sentença: foi condenado por posse ilegal de armas (duas, uma pistola e uma caçadeira, não esquecendo que já foi caçador), com três anos de prisão com pena suspensa e ao pagamento de uma coima de 1000 euros, a entregar aos bombeiros de Boticas. Alguém disse, no dia do julgamento, que a montanha pariu um rato. Recorde-se que o P. Fernando já tinha andado na justiça com um grupo de pessoas da Paróquia de Dornelas (por quem tenho o maior respeito), julgo que a Comissão da Festa de S. Sebastião, por causa da «casa do santo» (peço desculpa se não é esta a terminologia certa). As sentenças foram sempre favoráveis ao P. Fernando, ou melhor, à Comissão Fabriqueira. Porque é que a imprensa não divulgou isto como deve ser e só dá ênfase ao que não abona a favor do P. Fernando? Que intenções e interesses esconde a imprensa ou alguma imprensa? É assim que se deve acreditar na imprensa?

Depois de algum tempo de bonança, aparece agora esta suspeição. Mas juntamente com a suspeição, que não passa disso mesmo, já anda por aí espalhada mais uma vezeira de mentiras, noticiadas diariamente pelos jornais de referência, sobre atos e palavras que o P. Fernando proferiu, nomeadamente que foi nomeado outro pároco para Viade e que o P. Fernando não deixou celebrar a Missa a esse novo pároco. É tudo mentira. Nunca foi nomeado outro pároco. O P. Fernando nunca deixou de ser o pároco de Viade, tendo o pleno direito de celebrar, e só ele, a Eucaristia dominical e sem a sua autorização nenhum ato de culto se pode realizar nas suas paróquias. Alguma imprensa que por aí anda, que é preguiçosa e sensacionalista, que investiga e estuda pouco e que não tem a preocupação de se fundamentar como deve ser, com imparcialidade e seriedade – uma imprensa responsável é assim que deve agir – que só vive de boatos e mexericos, distorce tudo e informa a opinião pública de forma errada, com grave dano para a verdade e para o bom nome das pessoas. Rege-se por aquilo que queria que fosse verdade e não por aquilo que é mesmo verdade.

A juntar a isto tudo ainda temos o deplorável «diz que diz» do povo, que lança todo um conjunto de atoardas para a praça pública, muitas sem o mínimo fundamento e com claro exagero – como é confrangedor ver pessoas a abrir baús que já têm anos -, sem qualquer respeito e preocupação pelas pessoas que estão em causa, sabendo-se há muito tempo que muitas pessoas se refugiam no «diz que diz» porque gostam mesmo de falar mal dos outros e gostam do triste espetáculo da humilhação pública.

Alguém perguntará se me encarregaram de defender publicamente o P. Fernando. Não, ninguém me encarregou e quem sou eu para o fazer. O P. Fernando sabê-lo-á fazer muito melhor do que eu. O que parcamente escrevo não é para defender ninguém, mas é para manifestar repugnância por uma imprensa sensacionalista e mal-intencionada, que só vende mentiras, pelo apedrejamento público das pessoas a toda a hora, sem qualquer dó nem piedade – as pessoas, culpadas ou não culpadas, não deixam de ser pessoas -, pelo lastimoso espetáculo mediático da ridicularização das pessoas, pela falta de respeito e amor à verdade, pela condenação fácil e justiceira, pela insensibilidade da sociedade, que gosta de se divertir e fazer estardalhaço com os pecados e os fracassos das pessoas.  

2. No ano passado, por esta altura fiz um artigo para este jornal sobre alguns acontecimentos e tradições ligadas ao Natal, procurando esclarecer a razão de ser delas e alguns dados sem fundamento. Onde é que Maria, possivelmente, deu à luz Jesus? «Maria teve de dar à luz num lugar isolado e humílimo da casa de algum familiar de José, em Belém». Jesus nasceu em alguma sala ou quarto humilde de uma casa. De certeza absoluta que não estava lá nenhum burro nem nenhuma vaca. No seguimento de uma leitura cristológica do Antigo Testamento da Bíblia, quem deu a atual configuração ao presépio que fazemos em nossas casas foi S. Francisco de Assis, que nutria um grande amor pela criação, colocando assim animais à volta de Jesus. Na apresentação do terceiro livro de uma trilogia sobre Jesus Cristo, que recomendo, o Papa Bento XVI limitou-se a dizer o que já sabemos há muito tempo, que na hora do nascimento de Jesus não estava lá nenhum burro nem nenhuma vaca. Mas não mandou retirar os referidos animais do presépio, que fazem parte das profecias sobre Jesus Cristo. Muitos cristãos espantaram-se, o que só põe a nu a formação deficiente que muitos têm sobre a sua fé. A vaca e o burro não são nenhum dogma de fé. Se antes de irem atrás do ruído do mundo, lessem antes o livro, faziam bem melhor. E que tal dar o livro de presente a alguém? Boas festas e bom natal para todos.

06.12.12

Mais um ano litúrgico que ficou para trás. Toda a Igreja é, agora, convocada para mais um advento, nunca esquecendo que está sempre em Advento. Jesus Cristo veio, vem e virá. Por vezes, nós, cristãos, vivemos tão preocupados com o céu, o purgatório e o inferno no fim da vida, que nos olvidamos de que essas realidades já se estão a viver e a antecipar aqui e agora. A eternidade não será senão a plenitude daquilo que ansiamos e construímos ao longo da vida, dando-se o devido espaço para as surpresas da misericórdia de Deus. Se assim não fosse, esta vida seria uma inutilidade e uma perda de tempo, um cálculo errado e uma fantasia indecente do criador. Mas não é. O presente da vida é o tempo favorável para dar consistência e grandeza à vida e ser mais homem com Deus e com os outros.

O Advento lembra à Igreja de que tem de estar sempre no posto de vigilância, com um coração expectante por Aquele que lhe dá acesso ao amor pleno e eterno. Jesus Cristo anda por aí. Deixá-lo passar e não o acolher (que é o que muitas vezes nos acontece) é uma distração imperdoável. Não falta quem nos adormeça. Ele é sempre o Emanuel, o Deus connosco, que nos salva e inquieta para sermos mais, na sua Palavra e nos sacramentos, mas também nos muitos apelos e desafios do mundo atual, nas vozes dilaceradas que esperam um coração cheio de compaixão, nas mãos calosas que desejam aconchego e alívio, nas lágrimas de quem quer contemplar uma aurora suave, que dê lugar a um dia cheio de luz sempiterna.  

O Advento é preparação para o Natal. Sem advento, isto é, sem abertura do coração a Deus, sem conversão da vida ao Deus que me quer encher de vida plena e de graça, sem aproximação ao irmão que devo amar, seja ele quem for, também o Natal não será Natal. Ou então será o que parece muitas vezes: uma época onde se cantam e ouvem músicas até ao fastio, uma festarola para troca de prendas de que não precisamos, um encontro de família porque é a tradição (sem qualquer ligação com o nascimento de Jesus, como muitas já fazem), um desperdício de ornamentação, com enfeites e luzes, uma repetição de rituais que não trazem nada de novo à vida, uma agitação que cansa e um frenesim sem alma.  

Advento é preparar o acolhimento de Deus, que me quer humanizar e salvar, no concreto da minha vida. Muitos batizados precisam de encontrar Deus no quotidiano da vida. No mundo em que vivemos, uma multidão de cristãos só o são de nome, porque alguém os levou e obrigou a cumprir a tradição religiosa, e quando questionados sobre ela, não a negam, mas depois vivem como se Deus não exista. No campo teórico, concordam com a existência de Deus e com as verdades da fé, mas, na prática, no dia-a-dia, esse Deus em quem dizem acreditar não lhes diz nada. Dizem crer em Deus, mas vivem sem Ele. Que sentido tem uma fé assim? É o ateísmo prático. No campo das intenções e das ideias, concorda-se com a fé e as suas disposições, mas depois não se dá importância nenhuma a isso na vida, vivendo-se ao sabor do que mais convém, do que mais interessa, do que é mais fácil, daquilo que o mundo dita e postula, numa serena e tranquila mundanização. Este tipo de ateísmo é altamente pernicioso para a fé, como o afirma Bento XVI: «No nosso tempo verificou-se um fenómeno particularmente perigoso para a fé: de facto, existe uma forma de ateísmo que definimos «prático», no qual não se negam as verdades da fé ou os ritos religiosos, mas simplesmente se consideram irrelevantes para a existência quotidiana, destacadas da vida, inúteis. Então, com frequência, cremos em Deus de modo superficial, e vivemos «como se Deus não existisse». Mas, no final, este modo de viver resulta ainda mais destrutivo, porque leva à indiferença à fé e à questão de Deus».

 

Muitos ditos cristãos, são cristãos culturais ou sociológicos. São cristãos porque o cristianismo é a religião social e há uma tradição cristã. Fizeram o percurso «habitual» na Igreja, mas foi um percurso sem convicção e a adesão do coração. A fé foi sempre encarada como algo a mais, que não importa muito. Não descobriram a beleza do Deus em quem dizem acreditar e não aprenderam a levá-lo para a vida. Chegada a adultez, renunciaram a uma vivência madura da fé e dão-lhe tanta importância como uma pedra da calçada, a não ser para as urgências onde o mundo se manifesta impotente. Deixam-se levar nas ondas de uma fé passiva, fria e incoerente.

 

Este tempo do advento é um tempo oportuno para darmos o devido espaço que Deus merece na nossa vida. Deus não poder ser só uma ideia ou uma teoria, ou um conjunto de crenças e valores. Deus é alguém que me convida para uma relação de amor, no concreto da minha vida e todos os dias da minha vida. Que me interessa uma fé ou um Deus que não dá uma forma e um sentido novo à minha vida, um Deus que não mexe com a minha conduta e com as minhas decisões e que não invade todos os aspectos da minha vida? Que valor tem uma fé que não leve ao compromisso efetivo e afetivo com a vontade de Deus? Não tenhamos ilusões: ser cristão de nome não vale nada. O próprio Jesus criticou severamente o formalismo e o exteriorismo que existia na religião judaica do seu tempo, sem um compromisso e uma entrega vivencial a Deus. Serve o mesmo aviso para os muitos ateus práticos que por aí andam.

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