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minhas notas

11.06.12

O Papa Bento XVI, na sua mensagem para o dia Mundial das comunicações sociais, 20 de Maio, resolveu, mais uma vez, surpreender: propôs a valorização do silêncio. Assim à primeira vista, parece um pouco descabido e até provocador. Quem habitualmente comunica, quer aprender técnicas e estratégias de comunicação e melhorar o uso da palavra. O silêncio é, muitas vezes, encarado como não comunicação ou comunicação pobre. Quem já não viu jornalistas atónitos e embaraçados diante do silêncio dos seus interlocutores? Os blackouts, por norma, geram nervosismo e mal-estar na comunicação social. Mas também é verdade que o excesso de palavra, sem escuta e reflexão, pode ser não comunicação e um ruído estridente que irrita e ensurdece. Por isso é importante o silêncio, para a escuta e a reflexão. Sem o silêncio, para se dar espaço ao outro e para se dar algum conteúdo ao que se diz, a comunicação torna-se uma palração angustiante e um falatório inútil e maçador. Diz o Papa, de forma eloquente: «O silêncio é parte integrante da comunicação e, sem ele, não há palavras densas de conteúdo. No silêncio, escutamo-nos e conhecemo-nos melhor a nós mesmos, nasce e aprofunda-se o pensamento, compreendemos com maior clareza o que queremos dizer ou aquilo que ouvimos do outro, discernimos como exprimir-nos. Calando, permite-se à outra pessoa que fale e se exprima a si mesma, e permite-nos a nós não ficarmos presos, por falta da adequada confrontação, às nossas palavras e ideias. Deste modo abre-se um espaço de escuta recíproca e torna-se possível uma relação humana mais plena. É no silêncio, por exemplo, que se identificam os momentos mais autênticos da comunicação entre aqueles que se amam: o gesto, a expressão do rosto, o corpo enquanto sinais que manifestam a pessoa. No silêncio, falam a alegria, as preocupações, o sofrimento, que encontram, precisamente nele, uma forma particularmente intensa de expressão. Por isso, do silêncio, deriva uma comunicação ainda mais exigente, que faz apelo à sensibilidade e àquela capacidade de escuta que frequentemente revela a medida e a natureza dos laços».

 

Vivemos numa cultura em que se usa e abusa da palavra. Há pressa em dizer alguma coisa, por mais banal que seja. Toda a gente quer expressar opiniões e não se foge ao atrevimento de falar de tudo, como se de tudo se soubesse. Vivemos na feira das opiniões. Sabe-se de tudo e não se sabe de nada. Muitos andam sempre a correr para contar a última novidade. Passam-se horas e horas no Facebook e no twitter. Dizer e falar a toda a hora, nem que sejam futilidades, tornou-se um passatempo (não estou a dizer que no Facebook só há futilidades, longe disso). Mas, tudo bem prensado, pouco se diz e o que se diz vale pouco. E assim acontece porque não vivemos numa cultura que privilegia o silêncio activo e contemplativo, a escuta e a reflexão. A vida é vivida, a toda a hora, com um ruído de fundo, seja um rádio, uma televisão, conversas frívolas, uns auscultadores nos ouvidos. A nossa comunicação, tanto social, como individual, acaba por ser, maioritariamente, monótona e vazia, salvo raras excepções. Comunica-se e fala-se muito para se ir passando o tempo, sem grande substância, exigência e vontade de proximidade. 

 

Noutros tempos, não tínhamos os meios de comunicação que hoje temos. Comunicava-se pouco, mas cada vez que se fazia, comunicava-se algo verdadeiramente significativo. Os meios eram pobres, mas a mensagem era rica e valorosa. Quando se falava, falava-se pela certa e não se perdia tempo na tagarelice oca. Agora temos muitos meios de comunicação, tão práticos, rápidos e eficientes, que de alguma forma nos pressionam a comunicar, mas a comunicação, em grande parte, é vã e pobre. Acaba por ser uma torrente de banalidades e de insignificâncias, que pouco ou nada traz à vida, não esquecendo, claro está, quem comunica bem e com equilíbrio. Comunicar tornou-se um entretenimento, até quase um jogo.

 

Hoje em dia, somos bombardeados com informação a toda a hora, de todos os quadrantes. Há um recurso exagerado à palavra e não se dá o devido tempo para se assimilar e sintetizar o que se informa e comunica. A informação é uma espécie de furacão permanente, que não dá tempo para arrumar nada e que a toda a hora nos quer manter suspensos e engolidos na sua voracidade. Não se dá tempo para se criar um verdadeiro distanciamento em relação à informação e promover uma séria reflexão e crítica a essa mesma informação, correndo-se o risco de a informação não informar, mas desinformar, manipular, mas não formar, entreter, mas não comunicar. «Quando as mensagens e a informação são abundantes, torna-se essencial o silêncio para discernir o que é importante daquilo que é inútil ou acessório» e «é necessário criar um ambiente propício, quase uma espécie de «ecossistema» capaz de equilibrar silêncio, palavra, imagens e sons», afirma Bento XVI.

 

Precisamos de redescobrir o silêncio. É o bálsamo que está a fazer falta à nossa vida moderna e à vida de muitas pessoas. A nossa cultura divorciou-se do silêncio. Temos hoje uma cultura do entretenimento e do ruído e parece que já não conseguimos viver sem eles a toda a hora, o que é mau. Prova disso, é a experiência que muitas pessoas nos contam da sua visita a conventos ou mosteiros: aquele ambiente para elas era escabroso e insuportável. Dar valor ao silêncio não é torna-se monge. É saber viver a vida com equilíbrio. Sem o devido silêncio que nos ajude a «pesar» a vida e suas experiências, viveremos uma vida muito ao sabor da espuma sem vermos as maravilhas da profundidade, seremos balões nas mãos de feirantes oportunistas e seremos pessoas sem densidade, mergulhados numa vida superficial. Sem silêncio teremos sempre muito pouco para dizer, já que comunicar é muito mais exigente do que pode parecer, e se se é crente muito mais: «Educar-se em comunicação quer dizer aprender a escutar, a contemplar, para além de falar; e isto é particularmente importante para os agentes da evangelização: silêncio e palavra são ambos elementos essenciais e integrantes da acção comunicativa da Igreja para um renovado anúncio de Jesus Cristo no mundo contemporâneo». 

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