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minhas notas

17.10.12

No último número do Notícias de Barroso, o capitão Paulo Delgado chamou a atenção para os muitos problemas que a caça atravessa e as potencialidades que ela tem e que ainda estão por explorar ou maximizar. Espero que as autoridades responsáveis pela caça não deixem de ter em conta mais um alerta e as propostas ali lançadas. Um bom número de caçadores abandona a caça todos os anos, o que é lamentável, porque é menos um pouco de lazer que deixam de ter na vida (a vida não é só trabalhar e gerar dinheiro, como pensa o governo) e é menos receita que se movimenta nos interesses legítimos à volta da caça. Sou um aficionado da caça, como já tiveram a oportunidade de perceber por alguns artigos aqui publicados. Não porque diabolicamente tenha gosto em abater animais ou em causar-lhes sofrimento, mas pelas benesses que me oferece. É uma atividade que alarga o leque das emoções, altamente relaxante e retemperadora, que proporciona exercício físico, contacto com a natureza, um pouco de aventura e surpresa, assim como bons momentos de hilaridade, convívio e camaradagem. Ingredientes importantes para o equilíbrio e o caldeamento da vida.

Nos últimos anos, na minha singela opinião, a caça não tem seguido o melhor rumo. O Estado, que tem gosto em complicar tudo e que preconceituosamente a considera um "luxo" de mandriões e pandilhas (e não é só o Estado que pensa assim, muitas cabecinhas mesquinhas também o pensam), tem feito o favor de a tornar burocrática, cara e inacessível. A vaga associativa, que muitos consideram a salvação da caça, está muito longe dos resultados que se almejavam, e até tenho a firme convicção que só veio suscitar invejas, divisões, mau ambiente entre caçadores e o aparecimento de coutadas habilidosamente geridas ao serviço dos interesses de grupos de caçadores.  

Vejamos mais em pormenor. Em primeiro lugar, acho que o Estado, na concessão da carta de caçador e licenças afins, devia adotar uma atitude mais preventiva e formativa e não tanto autoritária, legalista e repressiva. O exame para tirar a carta de caçador é desnecessariamente exigente. Passado um mês poucos se lembrarão do muito que tiveram que decorar para o exame. Tendo-se em conta o nível de alfabetismo real do nosso país, era preferível que o Estado organizasse sessões de formação obrigatórias para os caçadores, promovendo o conhecimento das espécies cinegéticas e a sua atividade, a conduta moral do caçador, o respeito e o cuidado pela caça, a segurança, entre outras coisas. Julgam que muitos dos que reprovaram nos exames deixaram de caçar? É claro que não, e poderão até agir com desprezo e revolta.

Em segundo lugar, a burocracia que rodeia o caçador e a caça é inexplicável. Compreendo que se tenha de ter alguma prudência, porque muitas pessoas não podem ter uma arma na mão, e que é preciso agir com muita responsabilidade. Mas isto não deveria ser motivo para massacrar o caçador com papelada, quase se dando a ideia de que se quer fazer marcação cerrada ao caçador, que devia era ter juizinho e estar a fazer outra coisa "mais útil à sociedade", ou então é jogada de bastidores para deixar a caça à mercê de um punhado de privilegiados. Como é que se justifica que na renovação de um documento, em Portugal, se tenha de apresentar sempre de novo todos os documentos, como se tivéssemos nascido à pouco do seio da nossa mãe? O Estado não tem memória e não tem arquivo? É desesperante. Já assisti a abandonos de processos, em plena secretaria da PSP, pela impaciência que provoca nas pessoas. Poderíamos e deveríamos ter outra maleabilidade e outra simplificação. O mesmo se diga em relação aos custos. Injustificadamente, a caça começa ser uma atividade cara, originando descriminação e desigualdade. A caça é um direito do cidadão, desde que devidamente legalizado, e não um privilégio, e os direitos promovem-se com justiça e não se dificultam. 

Em terceiro lugar, acho que caímos numa "febre associativista", que só veio trazer mais prejuízos do que benefícios, a agudização de algumas dificuldades e problemas, dando-se um machadada decisiva no carácter aventureiro e livre de que a caça se deveria revestir. Não vejo qual é o sentido e a importância de se criar tanta associação. Como é que se podem atrair caçadores para os nossos concelhos se estão todos retalhados em coutadas? Bastava só haver associações municipais, e quem quisesse caçar numa determinada associação municipal, dirigia-se à respetiva Câmara. Como é caricato andar sempre a esbarrar com placas limítrofes, que fazem andar, muitas vezes, os caçadores em avanços e recuos incompreensíveis e absurdos.

Menos compreensível ainda é o regime exclusivista de que gozam muitas associações, que só permitem a inscrição e a caça a residentes ou oriundos daquelas Freguesias. Isto tem algum cabimento? Será que temos o direito de vedar uma determinada região do país aos outros cidadãos, sem motivo de elevada importância? E se agora os algarvios se apropriassem das praias e estipulassem que só os residentes no Algarve poderiam tomar banho e usufruir das praias? Não entendo a lógica que preside à atividade de determinadas associações. Não tem qualquer sustentabilidade o argumento de que os residentes é que tratam da caça e que por isso é que têm direito à mesma e os «de fora» que se arranjem por outras paragens. Ponham-se no papel de um cidadão citadino ou no dum cidadão que reside num concelho devastado pelos incêndios (num país democrata uns não podem ter mais direitos e deveres do que outros). Até, deixem que lhes diga, salvo raras exceções, vejo pouco cuidado e pouca atenção das comunidades residentes em relação à caça e mau seria que não fizessem alguma coisa por ela. Por vezes, os maiores destruidores da caça são alguns residentes, que não se inibem de usar todo o tipo de armadilhas para apanhar caça ou de passarem noitadas em perseguição da caça. Que eu saiba, não são pessoas de fora que fazem estas coisas.

Esperemos que esta época venatória seja proveitosa a todos os caçadores e que nos desperte para as mudanças e para as más escolhas que se fizeram nos últimos anos, na minha modesta opinião. Devemos defender uma caça responsável, livre, gerida com equilíbrio e equidade.  

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