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minhas notas

06.07.15

Possivelmente, andamos todos impressionados, por mim falo, com a falta de educação e com a carência de formação moral e ética que são manifestas nos comportamentos e atuações de muitas pessoas. Desde o simples cumprimento na rua (será que hoje se ensina cortesia?), aos relacionamentos cívicos e laborais, desde a estrada à resolução de atritos e conflitos, e desde a conduta à frente de cargos políticos e sociais até ao mínimo que se exige para se saber viver em sociedade, é de ficar reduzido ao silêncio, porque as palavras começam a esgotar-se, como as pessoas parece que desaprenderam a saber falar umas com as outras com simpatia, doçura e gentileza, no respeito mútuo e com verdadeiro interesse e atenção umas pelas outras, sem fingimentos e hipocrisias, independentemente de convicções políticas, clubísticas e religiosas, e a saberem estar na família, no trabalho e nos outros âmbitos da vida social com estatura moral e cívica. Acho que é o mínimo que se exige a pessoas humanas. Como muito bem diz o povo, pode-se ter mais ou menos cultura e ter mais ou menos importância e reconhecimento social, o que nunca se pode deixar de ter é boa educação e ética, que ficam sempre bem. Uma pessoa sem maneiras, rude, áspera, fria, desonesta, irresponsável, calculista, violenta, sem princípios, duvido que tenha o respeito e a consideração de alguém.

Dois grupos etários que hoje acusamos com alguma facilidade de falta de educação e de moral é a adolescência e a juventude. E de facto, pelo que vamos vendo e lendo, muita juventude (não generalizemos) não exibe a boa educação que lhe ficaria bem e há um conjunto de valores e princípios de que deveria ser portadora, porque vai conduzir a sociedade amanhã, e de que parece não ser, como a responsabilidade, a retidão, a honestidade, o sacrifício pela família e pelos outros, o altruísmo desinteressado, a capacidade de saber vencer as dificuldades, a tolerância, o respeito pelos compromissos, o bom trato com todos, entre outros, valores e princípios fundamentais para se ser pessoa com os outros e em sociedade. Já não é de agora acusar os jovens. Já o filósofo Sócrates, quinhentos anos antes de Cristo, se queixava no seu tempo, mais ou menos com estas palavras, de que «os jovens de hoje gostam do luxo. São mal comportados, desprezam a autoridade. Não têm respeito pelos mais velhos e passam o tempo a falar em vez de trabalhar. Não se levantam quando um adulto chega. Contradizem os pais, apresentam-se em sociedade com enfeitos estranhos. Apressam-se a ir para a mesa e comem os acepipes, cruzam as pernas e tiranizam os seus mestres». A verdade é que, possivelmente, os jovens são os menos culpados das muitas acusações que lhes dirigimos. Nós, sociedade, é que temos de nos questionar que educação transmitimos e como a transmitimos e, neste campo, acho que existem muitas falhas. As principais instituições sociais que devem veicular uma boa educação fazem-no de forma confusa e desarticulada.

Não existem sociedades ou tempos perfeitos. Todas as eras têm aspetos positivos e negativos, progressos e retrocessos. Temos tendência para idolatrar o passado. «Antigamente é que era, agora é outra coisa». «No meu tempo tudo era diferente, agora está tudo mudado, não para melhor. Isto vai de mal a pior». Que estranha forma de vermos a vida! O paraíso não está no presente ou no futuro, está no passado. Lá trás é que foi bom, agora nem tanto. Não é assim que devemos ver a vida e, se somos crentes em Deus, muito menos ainda. Primeiro porque ninguém tem o seu tempo. Somos de todos os tempos. Há que saber acompanhar cada tempo e cada era. Depois porque o que verdadeiramente conta é construir e viver o presente, ajudando o mundo e a sociedade a serem cada vez melhores. O passado já não está nas nossas mãos. Serve apenas para sabermos e respeitarmos as nossas raízes e nos ajudar a evitar os mesmos erros no presente e no futuro. Por fim, como crentes, acreditamos que o melhor está ainda por vir, porque caminhamos para uma plenitude. Se há algo que vale a pena salientar, sem idealizar, é a articulação e a complementaridade que existia há quarenta ou cinquenta anos ou mais, e que hoje não existe, entre as principais instituições da sociedade: tropa, Igreja, família e escola. Hoje, estas instituições estão pouco presentes na vida dos adolescentes e dos jovens ou estão presentes de forma deficiente e intermitente. A maioria deles cresce no meio de atividades e de diversões, que, de facto, divertem e entretêm, mas não educam.

A tropa exercia um papel importante na transição para a idade adulta e na integração social, para além de permitir o encontro de pessoas da mesma geração de todo o país. Ajudava a interiorizar a disciplina de vida, o aprumo, o saber viver com regras, o comportamento adequado, o saber trabalhar em equipa, o respeito saudável pela hierarquia, a organização e o método, o brio e a responsabilidade. Não defendo o regresso da tropa, até porque do dia da minha inspeção só me lembro dos muitos nomes desapropriados com que massacraram os mancebos, ditos por capangas militares que empertigavam as veias do pescoço, mas acho que faz falta uma instituição que comunique estes valores e que promova o salto para a adultez. A Igreja contribuía muito para a formação humana, social e espiritual das pessoas. A fé não é só um credo. A fé também é um conjunto de valores humanos e sociais e um conjunto de sentimentos que dão densidade à interioridade. Muita gente que passou pela Igreja, nos seus muitos movimentos e instituições, saiu com outra riqueza interior e com uma postura de que são visíveis as suas marcas. A Igreja formava pessoas. A família tinha também uma ação basilar. Os pais tinham a preocupação de acompanhar os filhos, dando-lhes o exemplo antes de mais, e exerciam a autoridade, possivelmente, com alguns excessos, mas havia um caminho e um discurso claro quanto ao ser e estar na vida. Hoje a família está muito instável e tem um discurso desordenado e difuso, subjugado aos «peritos da educação» e agrilhoado ao hedonismo e ao materialismo. A escola completava a família. O professor, para além de comunicar os conteúdos do saber e do conhecimento, que não sofriam grandes flutuações, era também um educador rigoroso e exigente, que promovia o desenvolvimento das capacidades, a interiorização de valores e o crescimento humano.

Recuperar o protagonismo na educação e promover uma nova articulação e complementaridade entre estas instituições sociais, enriquecidas pelos conhecimentos e a experiência que temos atualmente e configuradas às novas realidades que enfrentamos, será um contributo decisivo para formarmos pessoas melhores e transmitirmos a educação que é essencial num ser humano, porque é nas instituições que se cresce. Infelizmente, vamos percebendo que, hoje, educa mais a comunicação social e a Internet e seus sucedâneos do que a família ou a escola e o resultado, como vemos, não é bom.

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